quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Instinto selvagem

Este texto é o 5º de uma série. Clique aqui para ler os anteriores.

Algumas pessoas acham que os alertas sobre as doenças provocadas pelo consumo de carne são exagero ou tentativas de impor uma realidade questionável. Naturalmente, essas pessoas jamais chegam a pensar que o alarde em torno da suposta imprescindibilidade da carne na alimentação também pode ser falso. 

Nunca encontrei uma única notícia de um vegetariano que tenha morrido ou sofrido alguma consequência grave relacionada à sua dieta. Dois terços da população mundial sofre de anemia, e esse percentual é o mesmo entre vegetarianos e comedores de carne.

Tudo leva a crer que a dependência da carne é muito mais cultural do que física, embora muitos sustentem uma alegada necessidade biológica. Há quem acredite que a disposição para comer carne é inerente ao ser humano. Essa afirmação me leva à questão do instinto.

É interessante observar que, para um ser carnívoro, a simples visão de sua presa lhe abre o apetite. Por isso gatos caçam ratos que, para nós, são nojentos. O leão, ao olhar para uma zebra, enxerga o seu alimento. Não é preciso que a zebra esteja fatiada, sem pele, sem olhos, sem boca, sem focinho, temperada com vegetais, frita, cozida ou assada, parecendo qualquer outra coisa menos uma zebra. Ele saliva de ver o bicho correndo, vivinho.

Eu nunca lambi os beiços ao ver uma vaca pastando. Mas minha boca enche de água ao ver um pé de jabuticaba carregado, ou morangos vermelhos e suculentos. Costuma-se usar o seguinte exemplo: coloque uma criança numa sala com um coelhinho e uma maçã. Se ela comer o coelho e brincar com a maçã, você tem um carnívoro.

Já ouvi muitas histórias trágicas de porcos (animais onívoros) que mataram e comeram crianças desassistidas. Mas nunca na vida ouvi falar de uma criança que tenha pego um porquinho no quintal e o matado a dentadas. Quando falamos de adultos, alguém pode até argumentar que fomos educados a controlar nossos instintos. Mas e as crianças? Não é raro criança comer terra, areia, insetos (com um ano de idade eu tentei comer um besouro, salvo pela minha falta de dentes e pela atenção da minha avó) e até fezes. Alguém conhece uma criança que comeu seu hamster, sua tartaruga, ou mesmo que tirou seu peixinho do aquário e o engoliu?

É possível que eu esteja enganada, é claro. Porém, meus instintos me dizem que eu não nasci para comer carne, eu fui ensinada a gostar dela. E na época em que aprendi essa lição, eu não fazia a menor ideia de que aquela carninha tinha um dia sido uma vaca, uma galinha ou um peixe. Se alguém me dissesse, provavelmente eu não acreditaria sequer que o leite da caixinha tinha saído da teta de uma vaca. Eca, eu diria, com certeza.

(continua)

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Comer carne é mesmo uma necessidade biológica? (parte 2)

Este texto é o 4º de uma série. Clique aqui para ler os anteriores.

Prosseguindo a análise de fatores biológicos que determinam (ou não) a nossa dieta, cabe observar as diferenças de comprimento e de forma dos intestinos das espécies. Carnívoros possuem trato intestinal curto (de 3 a 6 vezes o comprimento de seu corpo) e liso. Isso faz com que a carne da qual eles se alimentam seja expelida rapidamente do organismo, evitando a contaminação por toxinas. Herbívoros, por sua vez, têm o intestino longo (de 10 a 12 vezes o comprimento de seu corpo), e repleto de vilosidades. Essa estrutura garante que os vegetais permaneçam no organismo por tempo suficiente para a absorção de todos os nutrientes necessários.

E quanto aos onívoros? Muitos autores dizem que seus intestinos são muito semelhantes aos dos carnívoros. Os defensores da ideia do ser humano como onívoro, por sua vez, afirmam que nossos intestinos são idênticos aos dos onívoros. Observando diversas representações gráficas, percebi que há animais com intestinos com formatos e tamanhos semelhantes e dietas diferentes.

A explicação para isso é que o intestino de cada espécie (mesmo as classificadas como onívoras) é mais longo quanto maior a importância do vegetal como fonte de energia. Ou seja, há onívoros cuja alimentação é predominantemente voltada à ingestão de carnes (intestino curto) ou de vegetais (intestino longo). O intestino humano, só para constar, mede de 10 a 11 vezes o tamanho de seu corpo, e possui diversas vilosidades e curvas que garantem que o alimento permaneça ali dentro por bastante tempo.

Isso talvez signifique que a dieta ideal para os seres humanos seria predominantemente vegetal, complementada por proteína animal. Ou seja, algo bem diferente de um prato de bife com batata frita, arroz e meia folha de alface. Um ponto que reforça essa teoria é o fato de que, ao contrário do que a indústria alimentícia tenta nos convencer (e geralmente consegue), a maior parte de nós consome uma quantidade de proteína muito maior do que necessidade diária, o que representa uma sobrecarga para o fígado, obrigado a processar todo o excedente.

Então por que eu resolvi extirpar a carne da minha dieta, ao invés de simplesmente diminuir a quantidade dela? Dentre outras razões, porque fiquei um assustada ao me descobrir que o processo da digestão - até o momento da excreção - dura, na melhor das hipóteses, cerca de 12 horas. Veja, a melhor das hipóteses quer dizer que a dieta seja predominantemente vegetal, repleta de fibras. Uma pessoa que não costuma ingerir verduras, grãos e outras fontes de fibras pode levar até 4 dias para eliminar os resíduos.

Isso quer dizer que a carne - já em decomposição - passa um tempão dentro do corpo humano. Talvez você não veja problema nessa demora para se livrar do cadáver ingerido, considerando que nosso organismo supostamente esteja preparado para isso. Mas é possível também que você não tenha lembrado que a carne que consome veio de um animal entupido de hormônios, antibióticos, agrotóxicos (estes se acumulam na carne durante meses, sem contar que muitos produtores tratam verminose do gado injetando herbicidas, em quantidades muito maiores do que as aplicadas no capim) e substâncias cancerígenas, usadas para a conservação da carne durante meses nos frigoríficos, e para manter a sua cor vermelha (certamente a cor acinzentada da carne putrefata afastaria os consumidores).

É inevitável concluir que, hoje, a dieta onívora provoca muito mais malefícios do que benefícios. O consumo de carne atualmente é muito maior do que era antigamente, e os estudos apontam para um aumento cada vez maior. As consequências não atingem exclusivamente a saúde humana, mas isso é assunto para ser tratado mais além. O que me cabe dizer, por ora, é que é ingenuidade não associar o incremento do consumo de carne ao aumento vertiginoso de casos de câncer e doenças cardiovasculares, dentre outras. Diversas pesquisas científicas têm comprovado essa relação.

Também não existe um consenso sobre a alimentação original do ser humano. Há quem acredite que somos onívoros desde sempre. Outras correntes acreditam que éramos inicialmente frugívoros (seres que alimentam-se exclusivamente de frutas), e que passamos a ingerir outros alimentos por necessidade. Eu, particularmente, vejo mais coerência nessa segunda alternativa.

Isso porque os seres humanos, nos primórdios de sua existência da Terra, não habitavam todo o globo, mas tão somente regiões tropicais, onde existe abundância de alimentos vegetais, de muito mais fácil aquisição do que os ariscos animais. Porém, ao migrar para outras regiões do planeta, as coisas mudaram. Além disso, é possível também que desastres naturais e alterações climáticas bruscas tenham obrigado nossos ancestrais a incluírem animais e derivados em sua dieta. Dietas se adaptam às necessidades. Mas isso são apenas teorias.

A questão essencial que cabe perceber é a seguinte: se somos, de fato, onívoros (seja originalmente ou em resultado de uma adaptação ao ambiente), isso significa que podemos nos alimentar tanto de vegetais quanto de animais. Especialmente hoje, quando a ciência já desenvolveu incontáveis formas de suplementação alimentar, e temos à disposição uma infinidade de alimentos vegetais ricos em nutrientes, uma dieta estritamente vegetariana bem variada e complementada pelo consumo de vitamina B12 é perfeitamente viável. E ainda evita diversos problemas advindos do consumo da carne. Prova disso é a saúde de ferro de diversos vegetarianos.

Todo o restante é bobagem. A crença infundada de que a carne e seus derivados seriam essenciais na alimentação humana já caiu por terra há muito tempo, basta pesquisar um pouco para saber. Toda a controvérsia cinge-se, portanto, a uma questão de escolha.

Ao compreender tudo isso que acabei de explicar, segui minha jornada em busca da realidade, ou seja, não desprezei nenhum conhecimento no processo de elaboração de uma escolha consciente. Argumentos como "mas todo mundo come carne", "comemos carne desde a pré-história", "o homem está no topo da cadeia alimentar", "mas eu não resisto ao sabor de um churrasquinho", "eu seria vegetariano se tivesse alguém para cozinhar para mim", "se as pessoas parassem de comer carne seria o fim da economia" ou "comer carne faz parte da natureza humana" manifestam a simples repetição de padrões desprovidos de fundamento. E a opção de viver de forma consciente é incompatível com a aceitação de paradigmas sem qualquer tipo de questionamento.

A seguir, traçarei algumas linhas sobre conclusões particulares que formei ao longo desse processo, antes de citar alguns argumentos que contribuíram para a decisão definitiva.

"A wise man makes his own decisions, an ignorant man follows public opinion"

Chinese Proverb

(continua)

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Comer carne é mesmo uma necessidade biológica? (parte 1)

Este texto é o 3º de uma série. Clique aqui para ler os anteriores.

Não pretendo me aprofundar muito nas características biológicas que identificam os animais classificados como herbívoros (alimentam-se de vegetais, exemplo: vaca), carnívoros (alimentam-se de animais, exemplo: leão) e onívoros (alimentam-se de qualquer coisa, exemplo: porco). Existem diversos estudos sobre o assunto facilmente encontrados na internet, escrito por gente muito mais autorizada do que eu: médicos, nutricionistas, cientistas, engenheiros agrônomos, veterinários e outros.

Como em qualquer discussão polêmica, cada parte procura favorecer o seu ponto de vista como se disso dependesse sua própria vida. Assim, temos de um lado defensores ferrenhos do consumo de animais, com seus argumentos biológicos e, principalmente, culturais, embora estes se confundam com aqueles. De outra parte, vegetarianos não se satisfazem em explicar sua opção, mas angariam em todas as áreas do conhecimento raciocínios que comprovem que são eles, e não os demais, que estão certos.

Na linha dos argumentos biológicos, não existe consenso. É fato que o organismo humano difere absolutamente do carnívoro. Em muito se assemelha ao herbívoro, mas apresenta também características em comum com o onívoro.

Alguns pontos são mais frequentemente analisados nos trabalhos classificatórios de animais por hábitos alimentares. O primeiro deles é a dentição. Carnívoros possuem dentes bem diferentes dos demais animais: pontudos, afiados, feitos para dilacerar a carne e engoli-la aos pedaços. Carnívoros não mastigam. Se você tem um cachorro, já deve ter observado que qualquer coisa que ele abocanhe desaparece imediatamente.

Herbívoros possuem dentes chatos e largos, próprios para a mastigação. Onívoros têm dentes de todos os tipos. Muita gente acredita que esse seria um ponto de semelhança com os onívoros, afinal, nós temos dentes caninos. Minha opinião é de que, a não ser que você seja um vampiro, seus caninos devem ser ridiculamente pequenos como os meus, e não servem para dilacerar a carne crua de um animal. Por isso você precisa de um garfo e de uma faca. Além disso, gorilas só se alimentam de frutas e têm dentes caninos enormes (maiores até que os de um vampiro!). Vários herbívoros possuem grandes caninos.

Outro ponto bastante discutido é o fato de os humanos, assim como os herbívoros, possuírem enzimas digestivas presentes na saliva. Isso acontece porque nossos ácidos estomacais são dezenas de vezes mais fracos que os dos carnívoros. Assim, nós precisamos mastigar bastante e enviar para o estômago um alimento "pré-digerido". Os herbívoros são capazes de digerir alimentos que os carnívoros não conseguem, convertendo matéria vegetal em proteína.

A principal diferença entre os humanos e herbívoros, arguida com grande animação pelos defensores do onivorismo, é o fato de que nós temos, no estômago e no intestino, enzimas capazes de processar carne. Bem, elas certamente são capazes de digerir carne de gente (e outras coisas mais nojentas que preferi não escrever para você não vomitar), nem por isso tenho visto maminhas humanas nos cardápios de restaurantes por aí. E os próprios cientistas responsáveis por essa grande descoberta afirmam que isso é resultado da dieta adotada pela espécie. Ou seja: temos essas enzimas por que comemos carne há milênios, e não o contrário.



"É sempre nobre, generoso e necessário, falar em erros cometidos, enquanto se podem remediar."
Eça de Queirós
(continua)

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

O convite - Flertando com a mudança.

Este texto é o 2º de uma série. Clique aqui para ler o anterior.

Matrix é um dos meus filmes preferidos. O primeiro, não os outros dois que completam a trilogia, trazendo interpretações e analogias forçadas, e deixando de responder as perguntas que eles mesmos propõem. O Matrix "original" é um filme completo em si, que dispensaria qualquer complemento. 

O que me encanta na trama é a possibilidade de se transpor a metáfora para incontáveis situações. Em Matrix, os seres humanos vivem presos em habitáculos atarraxados a máquinas que extraem energia de seus corpos,  enquanto suas mentes acreditam estar vivenciando uma existência que, na verdade, não passa de realidade virtual. 

Não é difícil visualizar situações às quais a metáfora se aplica. As reservas naturais do nosso planeta vão se esgotando e a maior parte das pessoas não se sente minimamente responsável por isso. Muitas apenas exclamam: "que horror! As pessoas deviam se envergonhar". O país segue imerso num mar de corrupção, e o assunto que corre solto é a novela, o Big Bosther, os desfiles do Carnaval. Uma pequena atitude de cada pessoa que vive em condições dignas poderia mudar o destino de incontáveis desafortunados pelo mundo afora, mas é difícil pensar nesse tipo de coisa quando a única preocupação é saber qual a próxima balada imperdível. 

Muita gente das classes mais endinheiradas acumula posses e viaja pelo mundo todo, sem a menor intenção de saber como vivem as pessoas dos países que visita. Há ainda os que se consideram benevolentes, por atirar migalhas a um povo morto de fome. Para religiosos, a ideia da Matrix pode se aplicar  de forma análoga àqueles que ainda vivem na ilusão da matéria, sem enxergar nada além desse plano.

Em qualquer dessas situações, a escolha entre a pílula vermelha e a azul representa, respectivamente, despertar para uma realidade que nem sempre é mais bonita, ou permanecer na ilusão. Nem todos os seres viventes têm a chance de fazer essa escolha. É necessário um mínimo de inquietação interna em busca da verdade para que a oportunidade apareça.

No filme, essa opção é oferecida ao protagonista Neo por Morpheus. Para mim, o convite para uma nova realidade foi feito pelo Yoga. Ao começar a conhecê-lo, percebi logo que, embora muitas pessoas sejam capazes de praticá-lo por anos a fio sem, no entanto, vivenciá-lo, há nele muito mais que um simples exercício físico ou de meditação: é um caminho de autoconhecimento.

Sendo assim, os primeiros sinais de transformação que o Yoga trouxe para minha vida foi uma consciência maior do meu próprio corpo. Também não foi difícil perceber que praticamente todos os instrutores de Yoga são vegetarianos. Dali em diante comecei a experimentar, por alguns dias, como seria minha rotina sem a ingestão de carne, e foi muito mais fácil do que eu esperava.

Também passei a prestar mais atenção ao meu processo digestivo quando comia e quando rejeitava carne. A diferença foi gritante. Na primeira hipótese, sentia-me mais bem disposta, mais leve. Por mais que exagerasse na comida, não precisava de um dia todo "lagarteando", como acontecia depois de uma orgia gastronômica numa churrascaria.

O problema é que minha única razão para ser vegetariana, até então, era o meu próprio bem estar físico. Talvez alguém me pergunte: "e isso é pouco?". Sim, é muito pouco. Infelizmente, assim como a maior parte das pessoas, eu não tenho amor próprio suficiente para deixar de fazer alguma coisa simplesmente porque me faz mal. 

Se não fosse assim, não existiriam mais fumantes, num tempo em que temos toda informação acerca dos malefícios do fumo à nossa disposição. Ninguém mais contrairia doenças sexualmente transmissíveis por ir para a cama com alguém que mal conhece sem usar proteção. Nenhum acidente automobilístico seria causado por embriaguez. Aliás, dificilmente alguém se embriagaria. Nem usaria drogas.

Difícil encontrar alguém que não saiba dos prejuízos que advêm do consumo excessivo de alimentos industrializados, açúcar refinado, manteiga, gordura trans, agrotóxicos, frituras, conservantes. Saber disso, porém, não impede que milhões de pessoas tenham doenças relacionadas à alimentação, como obesidade, colesterol elevado, problemas cardíacos e gástricos, só para citar algumas das mais comuns.

A verdade é que a maioria de nós não se ama o suficiente. Ao saborear um doce com mais calorias do que as necessárias para dois dias de atividade intensa, não costumamos pensar em quanto dele vai entupir nossas artérias e quanto vai virar celulite em nosso (pouco) amado traseiro.

E nas academias de ginástica, quantas pessoas estão realmente empenhando seus esforços na construção de um corpo mais saudável, e não somente mais bonito? Não é à toa que muitos jovens não se importam em sobrecarregar o fígado com excesso de proteínas, desde que isso enrijeça sua musculatura. Tantos maltratam o próprio corpo com anabolizantes, forçam o metabolismo com estimulantes, e consomem toda sorte de porcaria que um amigo bombado indicou. Saúde? Pfff... Quem se importa?

Diante disso, naturalmente, não havia em mim convicção para uma mudança de hábitos que, naquele momento, parecia extremamente drástica. Mas a ideia persistia rondando meus pensamentos.

Além de tudo, mesmo meus lânguidos esforços em favor da minha saúde precisavam de um embasamento maior do que a simples sensação de bem estar. Eu não estava tão disposta a confiar tanto em mim mesma. Foi então que minhas pesquisas tiveram início.

(continua)

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Uma escolha pela vida e para a vida

Este texto é o primeiro de uma série.

Quem me conhece direito sabe que uma das coisas que mais faço é pesquisar. Sempre que resolvo comprar um produto, contratar um serviço ou conhecer um lugar, realizo profícuas buscas, especialmente na internet, a fim de fazer as melhores escolhas possíveis.

Assim foi com meu forno elétrico, meu aspirador de pó, minha máquina de fazer pão, minha cama, minha máquina de lavar/secar roupas, meu secador de cabelo e tudo mais. Analisei características diversas, marca, potência, garantia, assistência técnica, preço, condições de pagamento oferecidas pelas lojas. Avaliei reclamações de outros consumidores, conversei com gente que já tinha o produto.

Antes da viagem surpresa que dei de presente de dia dos namorados para o meu amor, pesquisei tudo que pude sobre Salvador. Conversei com pessoas que vivem lá - conhecidas ou não, nativas ou não. Elaborei uma lista de todos os locais que poderíamos conhecer durante nossa curta - porém feliz - estadia. Antes de ir, comparei preços e visitei sites de dezenas de hotéis e pousadas. Logicamente, também pesquisei muito antes de comprar as passagens aéreas (com meses de antecedência).

A maior parte das minhas amplas pesquisas acaba virando planilhas no Excel, ou, no mínimo, uma série de anotações e listas para organizar as informações colhidas no processo. De vez em quando algum amigo me pede uma dica sobre algo que conheço e se surpreende ao receber um guia de compras/serviços/viagem.

Outras pessoas também me encaminham e-mails perguntando se a informação contida neles é verdadeira, porque eu sempre descubro. Hoax, lendas virtuais e golpes ou promoções, concursos e pedidos reais de doações de instituições sérias? Até hoje não me enganei.

Digo isso tudo somente por dois motivos. O primeiro é que, se você estiver pensando em comprar alguma coisa ou contratar um serviço, mas não sabe como escolher, ou ainda pretende visitar um lugar que eu conheço e gostaria de saber o que há para se fazer por lá (ou por aqui), pode perguntar pra mim. Talvez eu já tenha a pesquisa toda prontinha.

O segundo é só para você saber que eu procuro, cada vez mais, fazer escolhas conscientes. Talvez minhas razões não sejam válidas para outras pessoas, mas fazem sentido para mim. Sabendo disso, você pode concluir que não foi à toa que, há duas semanas, eu tomei uma das decisões mais importantes da minha vida: adotar a filosofia vegana.

Vindo de alguém que até pouco tempo pedia o bife mal-passado-quase-cru e usava botas de couro, resolver nunca mais consumir qualquer produto de origem animal - não só carne, leite, ovos e mel, mas também couro, lã, peles - nem comprar de empresas que fazem testes em animais, pode parecer uma mudança radical. Mas é simples resultado, mais uma vez, de muita pesquisa. 

Após abrir meus olhos para uma realidade que eu ignorava, optar pelo veganismo foi um imperativo de consciência. E não passa um dia sequer sem que eu sinta os benefícios crescentes dessa opção de vida, sem que uma sensação de felicidade e harmonia tome conta do meu ser. Os obstáculos - especialmente o preconceito e a ignorância - são ínfimos quando comparados à plena convicção de uma escolha correta.

Se quiser saber mais, continue acompanhando. ;)
Beijos

(continua)

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Abrindo as asas

Acontecimentos recentes têm a cada dia reafirmado a minha convicção de que mudar não apenas faz bem, como é também um processo natural. Muitas vezes, torturados pelo peso acachapante da rotina, sentimo-nos tentados a mudar o que quer que seja. O primeiro passo nesse rumo é extremamente válido, porque é ele (ou algum dos que se seguem) que nos desperta para o verdadeiro sentido da transformação. 

Quando nos prostramos como vítimas de uma inexorável inércia, moldamos a mudança em nossa imaginação. Pensamos em como nossa vida seria incrível em outras circunstâncias. Talvez em outra casa, ou em outra profissão, ou em outro relacionamento, ou em outro país. Cada qual nutre seus pequenos vislumbres de uma existência mais plena no campo que mais o incomoda.

O início dessa busca por algo de diferente tem o condão de mostrar que o problema, na maior parte das vezes, não estava onde imaginávamos, mas sim no simples fato de termos cedido à acomodação. E quando nos colocamos em movimento, começamos lentamente a sentir os primeiros benefícios dessa viagem mágica. O vento nos cabelos, o calor da marcha, a excitação do desconhecido. De repente, algo desperta dentro de nós: estamos vivos.

Não há nenhum demérito em mudar o destino no meio da jornada. Habituamo-nos a crer que o sucesso de uma missão está inevitavelmente atrelado a atingir um determinado objetivo. Na verdade, seria estupidez prosseguir na mesma direção uma vez que percebemos que não é para lá que queremos ir!

Não lembro exatamente quando foi que uma simples inquietação me impulsionou a tentar algo novo. Algo em mim dizia que era uma atitude cruel comigo mesma permitir que meu tempo de vida se escoasse, enquanto eu passivamente observava os acontecimentos se encadearem por conta própria. 

Eu não sabia como saciar a necessidade que urgia em mim. Então, fiz o que pude. Coloquei em prática minha vaga noção de mudança. Comecei a fazer coisas diferentes, todos os dias. Experimentar caminhos, sons, sabores, práticas. Não havia, ainda, nenhum interesse em me aprofundar em qualquer um daqueles novos conhecimentos.

Em dado momento, a busca criou vida própria. Uma experiência conduziu à outra, conheci pessoas que vivem de uma forma tão diferente da minha, venci preconceitos, desvendei novas filosofias. E me apaixonei pela jornada! Não há mais um ponto de chegada, onde me serão atribuídos os louros da vitória e eu descansarei na doce sensação da conquista.

Percebi que a natureza está em constante movimento e transformação. As águas dos rios correm para os oceanos. Evaporam, condensam-se e precipitam-se em forma de chuva. A semente, sob a chuva, germina. Os brotos crescem, florescem, frutificam, morrem e viram adubo. Lagartas se transformam em borboletas. Nada é naturalmente estanque. Só o ser humano faz um esforço hercúleo para manter posições.

Ao ouvir minha voz interior clamando por transformação, eu não sabia ainda o que poderia encontrar. Mesmo assim dei início a uma procura incerta que me conduziu por caminhos surpreendentes. Quando dei por mim, havia encontrado o que tanto buscava, onde menos esperava: em mim mesma. 

Minha grande transformação não é só resultado de coisas novas que agreguei (embora eu preserve o interesse no que ainda não entendo), mas do despojar de velhos hábitos e crenças. "It is hard to fill a cup that is already full"*. Subitamente senti despertar uma verdade ancestral, como que oculta no meu código genético. E a vida finalmente começa.

Não entendeu nada dessa "viagem"? Não se preocupe. Essa mensagem provavelmente não era para você. ;)


* É difícil encher um copo que já está cheio. Do filme Avatar.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Mudar faz bem?

Uma frase bastante popular - cuja autoria desconheço - diz que se você fizer o que sempre fez, terá o que sempre teve. Alguma coisa faz mais sentido que isso?

A maior parte das pessoas que eu ouço reclamar da vida continua fazendo tudo exatamente igual todos os dias. E suas reações diante de quem faz algo de diferente transitam entre o ceticismo e o espanto, passando pelo desdém e pelo escárnio.

Pergunto-me se tais manifestações não seriam reflexo do que sentem em relação a sua própria falta de coragem, disposição e força de vontade para promover as mudanças de que necessitam.

Mudar (para melhor) faz bem para quem muda. Mas ao que tudo indica a mudança alheia faz um mal danado para quem sofre de inveja, estagnação ou simples aversão ao que não consegue compreender. A boa notícia é que esse mal tem cura.

Tratamento recomendado: pílula vermelha.
Posologia: dose única.
Possíveis efeitos colaterais: incapacidade de voltar a adormecer a consciência que desperta, inevitável sentimento de exclusão social, desilusão como caminho intermediário entre a ilusão e a realidade e, por fim, a estranha sensação de que estar em paz consigo mesmo supera todas as aparentes dificuldades do caminho.

E aí? Alguém se habilita?

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

O caminho ao seu lado

Desconsiderando a hipótese do masoquismo e todas as possíveis formas de busca (consciente ou não) pelo sofrimento, creio que existam dois jeitos para uma pessoa obter êxito em seus propósitos: só ou em boa companhia.

A pessoa desacompanhada administra com exclusividade seus próprios desígnios. Presta satisfações apenas e tão somente a sua vontade e a sua consciência (ou à falta delas). 

A independência absoluta não é feita só de alegrias, porém. O ser humano, por natureza, refugia-se na companhia dos outros. Somos criaturas essencialmente sociais. E assim, fazem falta ouvidos atentos aos nossos desabafos. Carecemos de apoio para nossos projetos, de refrigério a nossos lamentos e de aplausos a nossas conquistas. 

De qualquer forma, por mais que incomode, a carência não será empecilho insuperável para quem tiver firmeza em seus objetivos. Certamente grandes feitos podem ser obra de quem não tem companhia melhor do que seus próprios sonhos. 

Hoje quero falar, contudo, da experiência de ter ao lado o melhor dos companheiros. Nenhum desafio parece ser maior que minha capacidade de vencê-lo, porque conto com o seu apoio. Nenhuma de minhas intenções é tratada com desdém. Eu posso manifestar o desejo de comer penne ao pesto no jantar ou de colocar meus pés sobre a superfície da lua; meu amor jamais me dirá que é impossível ou que é tolice. Antes, perguntará como pretendo fazê-lo e no que ele pode ser útil.

Não é só com o entusiasmo dele pelos meus potenciais triunfos que eu posso contar. Ele me oferece suporte real, encara o desafio ao meu lado. E não é raro entre nós que um adote as causas do outro como suas, não só por amor, mas também pela enorme afinidade de nossos interesses.

O sucesso a dois pode parecer mais fácil, justamente por satisfazer as necessidades emocionais de conforto, apoio e reconhecimento. E é. Entretanto, é fundamental – e não muito fácil – encontrar o parceiro certo.

Não basta ser alguém que esteja ao seu lado fisicamente, ocupando lugar no espaço. É preciso ser mais que uma companhia. Claro que para algumas pessoas pode ser suficiente alguém que simplesmente esteja por perto. Para mim, sorte maior é alguém que compartilha dos meus objetivos. Que não está ali por acaso ou falta de opção, mas tem uma razão (ou mais) para seguir na mesma direção que eu. 

Tenho certeza de que nunca na minha vida adulta eu sorri tanto como faço vivendo com meu amor (talvez quando bebê eu também acordasse sorrindo). Deve ser porque os sonhos jamais pareceram tão palpáveis. como agora. Ou, dizendo de outra forma: nunca antes dele a realidade chegou perto de superar minhas fantasias. E ao seu lado eu sempre sinto que vale a pena abrir meus olhos pela manhã.

Delícia, parabéns para nozes por esses dois primeiros meses em nosso lar-doce-lar! E grata por você existir! Amo você.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Manual do adulto que ainda sonha


Quando criança você sonhava, lembra? Sonhava ser a princesa do castelo e casar com o mais lindo dos príncipes. Sonhava ser super herói, pilotar foguetes ou carros de fórmula 1. Sonhava ter uma fazenda só para cuidar dos animais. Sonhava ser presidente do país e dar um jeito de nunca mais uma criança dormir na rua. Sonhava aparecer na TV ou ser o maior jogador de futebol de todos os tempos. Sonhava conhecer todos os países do mundo, que você nem sabia quantos eram. De qualquer forma, você só sabia mesmo contar até 100. Uma conquista alardeada a todos os membros da família: “tia, sabia que eu sei contar até 100?”


Na adolescência você sonhava. Teria uma banda de rock, escreveria um livro, moraria numa república só com seus melhores amigos. Viajaria com a mochila nas costas pelos lugares mais exóticos do mundo. Provaria para seus pais que viver de arte não era impossível. Alguns sonhos de infância ainda não tinham morrido. Mas você às vezes tinha vergonha de dizê-los em voz alta.

Você seguiu o rumo que as pessoas esperavam. Conseguiu seu diploma, um emprego, uma família. De vez em quando (mas bem raramente), você lembra que os astros do rock, os jogadores de futebol, as atrizes de cinema, os grandes escritores e os pilotos de espaçonaves são gente como você. Animais bípedes da ordem dos primatas pertencentes à subespécie Homo sapiens sapiens, com telencéfalo altamente desenvolvido e polegar opositor.

Quando pensa nisso, você se frustra e se deprime. Ressente-se do fato de que, sempre se esforçando para atender às expectativas alheias, deixou na mão logo quem?

Você prefere não desabafar com sua esposa ou seu marido, com medo de que ela pense que finalmente a pressão do trabalho fez você surtar, ou de que ele acene com a cabeça e diga “uhum”, sem ter ouvido uma palavra do que você disse. Melhor também não comentar com os amigos, ocupados demais em galgar posições mais elevadas na escalada social.

Para não se sentir um extraterrestre entre eles, sempre que perguntam como vai a vida, você não erra a mão: “como sempre, na correria!”. Você sabe que eles não esperam nenhuma resposta além dessa. Ninguém quer saber se você tem um novo jeito de olhar a vida. Se fez amizade com um iraniano. Se está estudando grego em casa.

Sabendo disso, ao iniciar o assunto, você não perde a compostura: “e aí, como vai? Só na correria?”. Claro que são aceitas variantes na conversa: “não levanto da minha mesa nem para ir ao banheiro”, “há meses não sei o que é final de semana” e “estou simplesmente enlouquecendo” são boas opções.

“Como vão seus sonhos?”, “quando foi a última vez que você conversou com um desconhecido?” e “tem algo diferente que você tenha experimentado recentemente e que queira me recomendar?” são perguntas que não passam pela sua cabeça. Se passam, você as ignora, sob pena de parecer ridículo ou desajustado.

Se surgir a oportunidade de abandonar o seu emprego de merda e fazer algo que tenha algum significado para você, é bom pensar mil vezes antes de arriscar uma posição já consolidada em troca de uma coisa incerta. Se decidir encarar o desafio, melhor dizer que o motivo da mudança foi a vantagem financeira. Se você for ganhar menos, a solução é mentir. Ou habituar-se aos olhares apiedados. E aos rótulos. Lunático, hippie e irresponsável talvez sejam os menos ofensivos.

Ao viajar, é importante fazer uma programação precisa para garantir a produtividade dessas férias. Nenhum momento deve ser desperdiçado com tolices como a mera contemplação. Sempre que possível, você deve se conectar à internet e postar as fotografias nos álbuns das suas redes sociais, deliciando-se ao imaginar a cara de inveja dos seus colegas de trabalho.

Talvez você pudesse se deliciar com a simples oportunidade de vivenciar experiências inéditas, imergir na cultura de um povo diferente do seu e, quem sabe, até mesmo descobrir que, na essência, nem é tão diferente assim. Ah, imagine, que bobagem. Publique logo essas fotos e vá tirar outras.

Algumas pessoas dizem que é difícil ser adulto. Difícil nada! É facílimo! Até mesmo aquele seu colega cretino que não mede esforços para levar vantagem consegue. A caixa do supermercado, a sua mãe, o gari sorridente, a sua ginecologista, o seu chefe e a sua secretária também. Ser adulto, na prática, requer apenas idade. Não é difícil. Mas pode ser um pé no saco se você não tiver coragem de rasgar as regrinhas de conduta que o afastam dos seus próprios sonhos. A gente sempre tem opção, e não escolher também é uma escolha.

Este manual contém somente uma regra. A única convenção que sempre vale a pena seguir é o respeito. Por si mesmo e pelos demais. De resto, quem não anda sobre os seus sapatos não pode nem deve definir o seu caminho.

Beijos

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Um belo sem-vergonha

A 28ª Oficina de Música de Curitiba terminou neste domingo, 31/01/2010, em grande estilo, com a plateia do Guairão lotada de músicos e apreciadores de boa música. O pernambucano Antônio Nóbrega fez o show de encerramento, que reuniu canções de seus seis últimos espetáculos. 

No palco, Nóbrega canta, atua, toca diversos instrumentos, dança, faz mímica e brinca com a plateia. Ainda menino, estudou violino e canto lírico durante anos, e fez parte da Orquestra Sinfônica do Recife. Depois de integrar o Quinteto Armorial, a convite de Ariano Suassuna, passou a ter contato com diversas expressões da cultura popular brasileira. A partir de então, teve início um trabalho ímpar.

O espetáculo contém maracatus, baiões, frevos-canções, choros, sambas, marchas-de-bloco. Nóbrega toca rabeca, violino, bandolim. Sete talentosos músicos o acompanham no violão, cavaquinho, saxofone, flauta, acordeon, alfaia, bateria e instrumentos diversos de percusão. De vários eu nem conheço o nome. Exercício interessante para ouvidos leigos como os meus é o esforço de identificar, no harmonioso conjunto que compõe cada canção, o som específico de cada instrumento.

Um espectador um dia disse a Nóbrega: "você pula tanto feito um cabrito durante o show que eu me canso só de ver". As estripulias do artista ora parecem brincadeira de criança, ora invocam a lembrança do Carlitos, de Chaplin. O personagem conquista a plateia, arranca risos, emociona.

Não sei descrever a beleza do primoroso trabalho de divulgação do cancioneiro popular, de encantamento com uma arte de raízes brasileiras de verdade. Algo que passa longe de futebol e bunda.

Aos quase 58 anos de idade, Antônio Nóbrega é um adulto sem nenhuma vergonha de ser menino. O mestre da arte brincante é um artista sem a menor vergonha de fazer rir e sorrir. E o espetáculo com que nos presenteia inspira a ser feliz. 

Para saber mais a respeito desse artista incrível, clique aqui, aqui e aqui.

Beijos!

Antes que eu confunda o domingo com a segunda

No domingão almoçamos numa churrascaria, ponto escolhido para a comemoração do aniversário do sogrinho. Recentemente tenho estudado algo sobre a dieta carnívora e talvez sejam as conclusões que começam a despontar que, pela primeira vez, fizeram o rodízio de carnes não ser tão apetitoso como sempre foi. 

Sempre me considerei do tipo que passaria fácil sem uma série de alimentos, exceto carnes. Hoje começo a pensar que talvez animais não sejam assim tão essenciais na minha dieta. Mas por enquanto isso é só uma ideia.

O calor estava insuportável. Não funciono muito bem sob altas temperaturas. A única coisa em que eu e namorido conseguíamos pensar era no quanto um ar condicionado nos faria felizes. Caminhar num parque, portanto, estava fora de cogitação. Ainda mais porque os parques curitibanos, nas tardes de domingo, são invadidos por pessoas que emporcalham tudo com latas de cerveja e lixo de todo tipo, inclusive musical, vindo das potentes caixas de som de seus veículos. Em resumo, o parque vira uma selva assustadora.

Fomos então ao shopping mais próximo, ver se havia algo interessante na programação do cinema. Não encontramos nada que valesse o caro ingresso. Passei por uma vitrine e quase cedi à tentação consumista diante de um bonito vestido, por R$ 69,00.

Engraçado como os conceitos de caro e barato são de uma relatividade absurda. Quando faço meus passeios pelas lojas de povão no centro da cidade, praticamente qualquer peça que custe mais do que R$ 50,00 é cara. No shopping, qualquer cifra com menos de 3 algarismos merece uma segunda olhada. A gente costuma ver tantos preços que ultrapassam 4 casas e as etiquetas com o "3 x de" escrito em letras pequeninas antes do número principal, que começa a achar que é normal.

Bem na verdade, é mais uma daquelas armadilhas do mundo moderno que, se a gente para pra pensar, vê que não tem sentido algum. Por que razão uma roupa, um sapato ou um acessório qualquer merece custar o meu salário? Um mês todinho do meu trabalho, conquistado após 5 anos de faculdade, fora os 11 anos anteriores de escola, o cursinho e a pós-graduação? Claro que eu gosto de me sentir bonita, bem vestida e, se possível, aliar o bom gosto e elegância a um tanto de conforto. Mas será certo considerar normal gastar tanto dinheiro numa peça à qual a maior parte do valor foi agregado por uma simples etiqueta?

Nem toda essa reflexão foi feita ali, diante da vitrine que exibia o modelito de R$ 69,00. Na hora, pensei somente em objetivos maiores, que certamente merecem mais o meu investimento do que uma peça de roupa. Pensei rapidamente que, embora eu esteja realmente a fim de uns vestidinhos novos, nada impede que eu use os que eu já tenho, ainda que isso implique ter que repetir o figurino em algumas situações. Por fim, concluí que as pessoas que ficarem reparando nisso - o fato de eu estar usando uma roupa que já usei antes - são fúteis demais para merecer o meu respeito. E assim - ufa - escapei da armadilha da loja de roupas.

O mesmo não ocorreu na livraria. Saímos de lá, eu e namorido, felizes da vida com nossas novas aquisições. Sem arrependimento algum. Usar trajes novos jamais me proporcionaram tanta satisfação quanto adquirir mais conhecimento.

Do templo do consumismo, fomos ao Café do Teatro, onde passamos algum tempinho que ainda tínhamos antes do show do Antônio Nóbrega no Guaíra (esse programa merece um post exclusivo, que escreverei a seguir).


Mesinha na janela do Café do Teatro - eu e a melhor companhia ever
Antes de terminar esse texto, vale comentar ainda mais um acontecimento do final de semana. No sábado, comprei nossos ingressos para o show acima mencionado. Custaram R$ 5,00 mais um quilo de alimento, cada um. No momento de pagá-los, com uma nota de R$ 50,00, atendi a uma ligação no celular e, distraída, simplesmente não peguei meu troco. Só percebi isso mais de uma hora depois, quando fui pagar por uma garrafa de água e não encontrei um trocadinho sequer na carteira.

Desolada, telefonei para a bilheteria do teatro e expliquei a situação. Pensei comigo que já tinha perdido 40 pilas, não custava nada tentar uma solução. Disse ao Seu Arlei, o senhor que me atendeu que, se por acaso, no fechamento do caixa, sobrassem R$ 40,00, eles eram meus. Seu Arlei me disse para ligar no domingo, depois do meio dia.

Foi o que fiz e, com grande alegria, fui informada de que, de fato, sobraram R$ 40,00 e eu podia passar para pegá-los. Duas pequenas lições brotaram do episódio. A primeira é que foi bom eu ter mantido a calma, em vez de acelerar o envelhecimento das minhas células com um estresse desnecessário. A segunda é que, nas situações mais inusitadas, a gente pode resgatar um pouco da fé no ser humano. Valeu, Seu Arlei!