Mostrando postagens com marcador a roupa nova do rei. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador a roupa nova do rei. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 4 de maio de 2011

A maior notícia de todos os tempos dessa semana

Bem, de repente toda aquela preocupação mundial com as usinas nucleares no Japão, bem como o sentimento de solidariedade para com as vítimas do desastre, simplesmente desapareceu. Tanto da pauta dos jornais como das conversas no dia-a-dia. É que o Príncipe William ia casar.

Nada podia ser mais importante que isso. O estilo de Kate, o bouquet, a estilista, o vestido, os chapéus, os detalhes da cerimônia, as incontáveis regras de conduta da família real e a grande pergunta: quais delas Kate seguirá e quais irá desrespeitar? Será que ela vai ousar comer camarão, carregar sua bolsa e usar os cabelos soltos? 

Levei alguns minutos tentando lembrar qual era o acontecimento mais relevante do mundo antes do casamento real tomar todos os canais da televisão. Lembrei. Gente, como será que está o Japão? Naturalmente não saberemos disso pelas notícias no jornal. Nem mesmo receberemos atualizações sobre como anda a vida dos recém-casados da realeza britânica. O assunto agora é o Osama, embora por pouco tempo. 

Quando ouvi o anúncio da morte na segunda-feira já fiz minha cara de cética. "Conveniente", pensei. O povo em festa nas ruas dos Estados Unidos, uma alegria maior que carnaval em Salvador. As notícias subsequentes só serviram para diminuir a minha já quase inexistente credulidade. Todo mundo esperando o cadáver pra surrá-lo feito um Judas, expô-lo em praça pública como um Tiradentes (um pedaço em cada um dos estados que compõem a nação estadunidense, talvez), mostrar pra esses terroristas feios barbudos o que acontece quando a CIA põe as mãos neles.

"Jogamos no mar". Ma-co-moa-sim jogaram no mar? Por quê? "Porque nenhum país do mundo aceitaria recebê-lo". Hellowww, nos States o pessoal ia curtir um monte zoar com esse presunto! Tá maluco? "É, tem razão. Fizemos isso para respeitar os preceitos islâmicos". Ah, TABOM, o cara era o homem mais procurado - E ODIADO - do mundo, e vocês queriam respeitar a religião dele? Vai dizer que rezaram pra Alá também? Bateram com a testa no chão virados pra Meca? E olha só, aqui no Alcorão diz que a pessoa será enterrada, não jogada no mar. "Uhum, mas achamos que o túmulo ia virar ponto de peregrinação". Mas isso era fácil de resolver, depois do exame de DNA, das fotos, da avacalhação pública, era só tacar fogo no que sobrasse! 

E outra: lembra do Saddam Hussein das cavernas? Aquele cuja morte foi filmada (dizem que por um celular), o vídeo foi posto no youtube, se duvidar alguém fez até um rap do enforcamento. Logicamente, assim como todo ditador sanguinário do mundo, Hussein tinha diversos seguidores. Por que ninguém se preocupou com o fato de os partidários sunitas de Saddam terem um lugarzinho pra colocar flores, derramar lágrimas e jurar vingança?

Legal mesmo foi aquela foto divulgada do Osama morto. O cara com a mesma aparência de 25 anos atrás e com um trabalhinho de photoshop que até eu fazia. Depois de um tempo com a foto circulando na internet, TV, jornais, anunciam: "pessoal, foi mal, aquela foto é falsa". Ah, jura? Depois ouvi o comentário de um especialista em morte de terroristas loucamente procurados em cavernas por uma década e posteriormente encontrados quando dividiam uma casa em zona urbana com 24 pessoas de 3 famílias diferentes e não tinham conexão com a internet nem linhas telefônicas (a Globo é rica em especialistas muito especializados). O tal especialista afirmou: "a foto foi adulterada, claro. Com certeza foi obra de algum jornal inglês". Pelo menos não botaram a culpa em nozes, né não?

E tem mais um detalhe ainda. Claro que todo mundo vai me achar uma insana de fazer uma pergunta besta dessas, mas o cara não podia ter sido preso, processado, julgado e depois, se fosse conveniente, até esquartejado de acordo com as leis imaginárias aplicáveis ao caso? Se as declarações sobre a operação dizem que o cara estava desarmado e só usou a mulher como escudo pra se defender, a não ser que essa esposa fosse o maior dragão que já pisou a areia do Oriente Médio, qual a razão para a execução sumária? 

Lembrei de outra coisa: e as fotos de simulação no computador de como Osama estaria nos dias de hoje? Fala sério! Em dez anos sendo procurado, o cara não ia ter a ideia de cortar a barba e tirar o turbante da cabeça? 

Óbvio que não sou fã do Osama ou seja lá quem tenha sido responsável DE VERDADE pela morte de milhares de pessoas em qualquer atentado terrorista do mundo. Reprovo qualquer ato de violência, inclusive aqueles praticados sob o ridiculamente falso pretexto de proteger a liberdade e a democracia - somente onde convém, jamais em países pobres africanos, por exemplo, onde o povo pode morrer de Aids, fome, guerra civil... Que se lixem, a ONU e os países ricos do mundo estão muito ocupados pra descascar esse abacaxi.

Mas essa de matar o Osama... Desculpem-me os mais sensíveis, mas não consegui me contagiar pela comoção geral. A imprensa começou toda discreta: "É, pode ser que, talvez, quem sabe, numa dessas, quiçá, porventura, essa coisa toda levante algumas dúvidas de algumas pessoas em algum lugar, por algum motivo, mas... Vamos aos gols da rodada!" Depois já estava uma coisa mais escancarada: "O governo americano avisa que pode sim provar que Osama está morto. Tem fotos, vídeos, amostras de DNA, várias provas, mas não vai mostrar pra ninguém". 

Ontem de manhã estava terminando de me arrumar para sair e, como me atrasei, o jornal acabou e começou o programa da Ana Maria Braga. Aí eu escuto: "essa morte está causando muitas dúvidas. Será que o terrorismo agora acabou? Será que o mundo está seguro? E até mesmo tem algumas pessoas que duvidam que o Osama tenha morrido. Então pra tentar entender tudo isso, vamos ouvir a análise de adolescentes estudantes de um cursinho pré-vestibular".

...

Se alguém queria transformar toda essa situação em piada, a Ana Maria já passou na frente, essa danada. É um circo! 

O Dé comentou que seria engraçado se o Osama colocasse um vídeo no youtube dizendo algo como "You got the wrong man, hohoho". Eu expliquei que isso jamais aconteceria porque Tio Sam cortaria sua mesada. Provavelmente, após receber o que lhe foi prometido para virar o novo inimigo mundial (afinal, a União Soviética já era e ninguém mais tem medo dos comunistas), Osama fez várias plásticas, uma mudança de sexo, e hoje se chama Karen Bin Smith, vizinha da Sarah Jessica Parker.

Claro que esse texto não passa de mera ficção, eu nem tenho qualquer opinião sobre o assunto, não acredito em teorias da conspiração e tal. Mas se por acaso eu tiver acertado na mosca, Sr. Agente da CIA, por favor, acredite, foi só um chute certeiro, eu juro que não conheço a Karen B. Smith.

A realidade é que toda essa mirabolante bem sucedida operação, como reconheceu a sábia Ana Maria Braga, despertou muitas dúvidas que, a julgar pelas manchetes de hoje, permanecerão sem respostas. Uma filhote de urso fofinha encontrada sozinha em um campo de petróleo no Alasca está ocupando tanto espaço no portal do G1 quanto a notícia de que a rendição de Bin Laden teria sido aceita (se ele não tivesse tentado usar sua mulher dragão para matar os super-soldados da força especial da Marinha ninja aérea terrestre sub-aquática americana). Essas questões, portanto, devem continuar nos acompanhando até que uma catástrofe natural ou nuclear ou um escândalo envolvendo celebridades nos faça esquecer dessa história toda (pelo menos até 11/09, quando será feita uma série de homenagens aos mortos, reportagens mostrando como estão os sobreviventes 10 anos após o atentado, documentários, uma pesquisa online sobre "onde você estava no momento do atentado?", uma eleição do sósia mais parecido com o Osama, uma edição do Fantástico dedicada ao assunto etc.):

- Afinal, o terrorismo agora acabou?
- Por que a Al-Qaeda ainda não se manifestou?
- Estamos seguros?
- Como o avião que caiu no Pentágono evaporou?
- Como os muçulmanos radicais suicidas podem ser motivados por aquela história das 72 virgens no paraíso? Imagina ouvir 72 vezes aquele chororô: "ai, vai com calma, é minha primeira vez, ai, assim dói, não quero mais". Se fossem 72 biscates bem rodadas a diversão seria muito maior.
- Por que o nome de Obama Bin Laden é tão fácil de confundir com o do Presidente Osama? Os jornalistas erram toda hora!
- O Bin Laden não estava morto desde 2001? Foi a Fox News que disse, em 26/12/2001.
- Foi por isso que jogaram no mar então? Ninguém aguentava mais o fedor depois de 9 anos e meio?

E agora, vamos aos gols da rodada!

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Algo mais sobre o Elefante

Uma informação que dá um pouco mais de sentido ao filme é a razão da escolha de seu título. Em princípio, numa pesquisa feita no mesmo dia em que vi o filme, encontrei a explicação de que o nome teria sido inspirado num documentário de 1989, de Alan Clarke, o qual sugere que os problemas com os adolescentes seriam "como um elefante na sala de estar", algo que incomoda, mas as pessoas fazem questão de ignorar. Ou algo assim.

Sinceramente, essa explicação me pareceu apenas mais um adereço à lindíssima roupa nova do rei. Não acrescentou nada. 

Depois encontrei, nesta bem elaborada crítica na Revista Contracampo, uma justificativa bem melhor. Na verdade, Von Sant entendeu errado o motivo pelo qual Alan Clarke escolhera o título Elefante para seu documentário em 89. Ele achou que tinha a ver com "uma antiga parábola budista sobre um grupo de cegos examinando diferentes partes de um elefante. Nessa parábola, cada cego afirma convictamente que compreende a natureza do animal com base tão-somente na parte que lhe chega ao tato. Ninguém vê ou sente o objeto na sua totalidade, mas todos arriscam um palpite totalizante – e, naturalmente, equivocado. Mesmo após ter descoberto o verdadeiro motivo pelo qual o documentário de Alan Clarke se chama Elephant, Van Sant afirma que o seu filme, rodado numa high-school situada em Portland, tem mais a ver com a parábola dos cegos".

Isso sim faz sentido e dá pelo menos uma sunga para o rei cobrir suas partes pudendas. De fato, diante de grandes tragédias, como a que aconteceu em Columbine em 1999, as pessoas tendem a observar e justificar os fatos sob perspectivas limitadas. Cada grupo se ocupa de encontrar um ou outro culpado para o terrível incidente.

Von Sant procura mostrar todos os elementos possíveis sem fazer uma escolha declarada por qualquer um deles. Apenas mostra que estava tudo ali: pais ausentes, jogos violentos, a velha segregação de grupos na escola, o acesso à compra de armas pela internet, um documentário sobre nazismo na televisão... Enquanto a maior parte das pessoas escolhe um desses elementos como causa para o ocorrido - como os cegos que descrevem o elefante cada um de acordo com a parte que está tocando - em Elefante não há escolhas, apenas a imersão do espectador.

Mais um mérito do diretor, que escapou da receitinha de bolo de Hollywood.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Paço de novo

Então o namorido topou a aventura - ele sempre topa :) - e à noite voltei ao Paço da Liberdade na companhia de meu amado. Desfrutamos de outro projeto cultural da casa, a Mostra Carta Branca, em que cineastas são convidados para indicar sete filmes para serem exibidos na sala CinePensamento.

O filme de ontem, indicado por Eduardo Valente, foi o Elefante, de Gus Van Sant (o mesmo de Gênio Indomável), uma versão pessoal do diretor sobre o massacre na escola Columbine (que deu origem ao premiado documentário de Michael Moore).

Tenho a impressão (talvez por ignorância minha, não sei) de que determinados filmes são escolhidos pelos críticos por razões incertas para ocuparem o posto de obra prima do momento. E, assim como a roupa nova do rei, tais expoentes de genialidade também supostamente só podem ser enxergados por quem é inteligente. Por medo de dizer que achou uma bosta e ser tachado de estúpido, todo mundo sai da sala de exibição bradando elogios: "revolucionário", "de uma originalidade ímpar", "sensível como o teatro". Como diria namorido, sorry, but I'm allergic to bullshit.

Mesmo na minha ignorância eu consegui visualizar alguns pontos positivos no filme. Vamos a eles: as tomadas meio vagas focalizando nada por motivo algum, em muitos momentos conseguem atingir o que me parece ser o objetivo do diretor: conduzir à introspecção. Isso também é reforçado pela trilha sonora, com sons distorcidos de modo a introduzir o personagem no contexto quando interage com os demais e, logo em seguida, introjetá-lo novamente em seus próprios pensamentos (que o espectador não sabe quais são, então só resta imaginar). A câmera na nuca dos personagens, caminhando com eles, uma fotografia primorosa, a naturalidade com que os adolescentes desenvolvem as cenas e, principalmente, a ausência de picos de emoção mesmo nas cenas que, em tese, seriam as mais dramáticas, têm por resultado um filme que exige que o espectador reflita, pense, tire suas próprias conclusões, até porque não apresenta as causas nem tampouco as soluções.

Parece bom, né? E seria ótimo, não fosse o enorme esforço para ficar acordada até o final. Não é que o filme seja ruim, longe disso, mas não é brilhante nem inesquecível. Pronto, falei. Podem os psycho cults me achincalhar agora. O rei está pelado, minha gente, vamos parar de surtar, por favor. 

A primeira vez que me lembro de ter me deparado com o fenômeno "roupa nova do rei" foi em Dogville, que é do mesmo ano que Elefante, 2004. Inclusive, Dogville era o favorito do Festival de Cannes, e acabou perdendo para o Elefante. Sobre o filme do cão: ok que o diretor tenha lá seus méritos de economizar no orçamento riscando o cenário com giz no chão, de retratar a maldade do ser humano e a hipocrisia da vida em sociedade e não sei o que mais. Mas daí a dizer que isso é o ápice da genialidade é carregar demais nos paetês imaginários da roupa do rei. Eu achei o filme MUITO chato, e o ritmo devagar quase parando é ainda mais difícil de suportar com a ausência de cenários. Só despertei mesmo na apoteótica cena final, em que a grande e graciosa heroína Grace termina, por meio da vingança sangrenta, igualando-se aos seus algozes. Pff. Aí vem um pshyco cult articulando exageradamente: o me-lhor filme que já vi na-mi-nha-vi-da! 

Respiro fundo e concluo que preciso mesmo desenvolver mais a minha tolerância. Porque se desenvolver a força física, posso acabar partindo para a violência. Just kidding.

De qualquer forma, como se pode perceber, a experiência proporcionou alguma reflexão. É sempre bom conhecer coisas novas, mesmo que seja para não gostar delas. Ah, e o Paço me conquistou de vez: além dessa sala de exibição bacana (by the way, a exibição foi gratuita e aberta ao público, mesmo assim só tinha meia dúzia de espectadores) e da sala onde, mais cedo, eu havia visto o concerto de bandolim, tem mais várias outras atrações: a sala de internet (acesso gratuito), a biblioteca, a livraria e lojinha de souvenires, e o melhor de tudo: o café. Charmosíssimo, com flores amarelas sobre as mesinhas, com as enormes portas abertas com vista para as frondosas árvores da Praça Tiradentes. Lindo! Certamente voltarei.

Beijos