Então, passados tantos anos, embora as lembranças torturantes da minha primeira ronoplastia ainda permaneçam vívidas em minha memória, resolvi que era chegada a hora de superar o trauma e buscar a realização daquele velho sonho de respirar. Minha colega de escritório tem uma amiga anestesista, que trabalha num hospital especializado em otorrinolaringologia. Essa pessoa fez uma listinha dos profissionais cujos pacientes têm os melhores resultados e saem mais satisfeitos com seus novos narizes.
Munida dessa lista de indicações, mirei nos dois primeiros. Um deles tinha agenda lotada pelos 2 meses seguintes e o outro não atende por convênio. Diante disso, considerei que a terceira colocação na lista não devia ser ruim. Marquei a consulta com o Dr. Medalha de Bronze.
O médico me pareceu confiável. Cara de caxias, estudioso, o que é um bom sinal num médico. Sempre asseverando que não queria ser anti-ético, deixou claro que a minha primeira cirurgia foi um horror. Achou absurdo eu ter tomado anestesia geral, a cirurgia ter demorado 3 horas, eu ter usado tampão, disse que além de o meu desvio de septo não ter sido corrigido, a situação foi agravada pela formação de cicatrizes grandes por dentro do nariz que impediam ainda mais a minha respiração. Afirmou ter certeza de que havia alguma espécie de enxerto na ponta do meu nariz, aquela que um dia foi a mais feia do mundo.
Marquei a cirurgia, fiz todos os exames necessários, consultei com o anestesista e voltei a consultar o otorrino 4 dias antes da data da operação. Conversamos sobre o pré e o pós operatório e recebi as recomendações necessárias. O médico fez mais um exame, ressaltando que a minha primeira cirurgia deixou meu nariz torto, mas que nisso ele não ia mexer. Perguntei então se não era possível corrigir também esse problema.
Esperava que a resposta fosse uma das alternativas a seguir: a) bem, isso implica numa correção estética, que seu plano não cobre, portanto vai lhe custar tantos milhões de reais; b) farei o possível, mas não posso prometer um resultado excelente porque é muito difícil corrigir uma cirurgia anterior; c) essa não é minha especialidade, então talvez você queira procurar outro médico.
Porém, o que ouvi foi: "Não, vamos só fazer você voltar a respirar. Depois você liga para o médico que te operou e diz que quer uma revisão". Ehm... Cuma? Ligar para o médico que o Sr. disse que destruiu meu nariz, depois de 10 anos, e dizer que quero a revisão dos 100.000 km? Evidentemente que se eu estivesse contente com o trabalho dele não haveria razão para estar buscando outro médico depois de uma década.
Mas ele estava irredutível: "Veja, é muito complicado mexer no trabalho de outro cirurgião... Vamos mexer só no septo, depois se você quiser arruma o resto". Sim, claro, posso muito bem tirar férias de novo, pagar instrumentação cirúrgica de novo, comprar remédios de novo, passar por duas cirurgias, dois períodos de recuperação, duas internações... E o Dr. assim concluiu: "Vamos fazer só isso, que assim eu fico mais tranquilo".
Bem, se é para deixar o médico tranquilo, faço qualquer coisa. Penso que seja obrigação de qualquer paciente consciente fazer tudo que estiver ao seu alcance para tranquilizar o médico que vai meter um bisturi no meio da sua face. A última coisa que queremos é ver essa pessoa nervosa, certo? Diante disso, resolvi tomar uma atitude que deixaria o Dr. Medalha de Bronze extremamente sossegado: desmarquei a cirurgia.
Imagina se chega um cliente em potencial ao meu escritório e conta que está sendo atendido por um advogado incompetente, que perdeu o prazo para protocolar um recurso, e que gostaria que eu assumisse a causa e fizesse o possível para reverter a situação. Eu olho para o cara e digo: "Olha, se você tiver alguma coisa mais fácil de ganhar, pode deixar que eu resolvo para você. Mas quanto a esse problema difícil, você liga para o irresponsável que está te representando no processo e diz que é pra ele continuar fazendo a mesma merda. Assim eu fico mais tranquila."
Marquei consulta então com os dois primeiros da lista, como devia ter feito antes. Um só tinha consulta para dali a duas semanas. O que não tem convênio, obviamente, tinha consulta para o dia seguinte. Esse médico me foi recomendado como o melhor em termos de estética. É um otorrino extremamente competente, professor e chefe do setor de Otorrinolaringologia da UFPR e, no que se refere à estética, foi definido pela anestesista que trabalha no hospital como um artista.
Eu sabia que pelo menos a consulta eu tinha condições de pagar. Além disso, o meu maravilhoso plano de saúde, que tenho graças ao emprego lindo do meu marido lindo, também cobre, ao menos parcialmente, procedimentos com médicos não conveniados. Então, valia a pena conferir se tinha jeito.
Já na consulta, concluí que o Dr. Marcos Mocellin era a escolha mais acertada. Não só pela experiência e pelas recomendações (várias outras pessoas também me garantiram que ele era excelente), mas pela confiança que ele passa, pelo modo atencioso e honesto que me atendeu. Explicou que realmente não seria fácil corrigir a primeira cirurgia, pois o tecido cicatrizado é fibroso, além de ele não saber o que iria encontrar ao abrir meu nariz. Também disse que aquilo na ponta parecia um enxerto.
Foi então que meu nariz ganhou o apelido (dado por mim) de Kinder Ovo, porque só ao abrir o Dr. Medalha de Ouro saberia o que tinha dentro. O Dr. Marcos disse, então, que não poderia me prometer o nariz mais lindo do mundo, pois o caso apresentava limitações próprias, mas que faria o melhor possível e, sem dúvida, melhoraria o aspecto estético e corrigiria totalmente a parte funcional. Era o que eu queria ouvir.
Ele explicou da dificuldade que é tentar corrigir o trabalho de outro profissional, porque é o nome dele que ficará associado ao resultado que eu tiver, e não do primeiro, que fez a bobagem. E é tão verdade que não cito aqui o nome do cirurgião que estragou meu nariz (que poderia pleitear uma indenização por danos morais seu eu fizesse isso, e eu prefiro não me arriscar), mas cito o do Dr. Marcos, que o consertou. Claro que só faço isso porque estou satisfeita com o resultado, que não é o nariz da Barbie (que nem combinaria com meu rosto), mas está de fato mais harmonioso e, o melhor, funcionando perfeitamente.
Após consulta do maridão ao setor responsável em sua empresa, descobrimos que o maravilhoso plano de saúde cobriria a maior parte do custo orçado para a cirurgia. Obviamente, marquei a operação para o primeiro dia em que o Dr. Marcos tinha horário disponível.