segunda-feira, 21 de março de 2011

Não é fácil, Vera

Eu gosto muito das minhas aulas de espanhol no Instituto Sol Miró, que recomendo a todos que têm interesse em aprender a língua mas não estão dispostos a vender um rim para pagar uma fortuna em outras escolas de idioma, nem tampouco passar 6 anos em cursos regulares enfadonhos. Lá eu descobri que gosto de estudar, desde que seja algo do meu interesse. 

Acredito que um dos motivos que torna as aulas no Sol Miró tão interessantes é o fato de sempre apresentarem temas relevantes, especialmente nos muito bem trabalhados exercícios de conversação, seja para nossa vida profissional, pessoal ou mesmo questões mais filosóficas. Nesse sábado tivemos prova oral no módulo avançado. Na segunda parte da avaliação, cada aluno teve que fazer uma exposição individual, em resposta a uma pergunta sorteada pela professora. A minha questão foi expressar o que penso sobre a frase atribuída à emergente Vera Loyola, segundo a qual "o verdadeiro amigo não é o que é solidário na desgraça, mas o que suporta o seu sucesso".

Estou ciente de que Loyola não é exatamente um expoente da filosofia contemporânea, mas nada impede que pílulas de sabedoria venham das fontes mais inusitadas. Até porque, se a Vera é uma pessoa totalmente sem noção e deslumbrada, devemos reconhecer que há gente pior: pessoas que a invejam. Portanto, de falsos e verdadeiros amigos eu aposto que ela entende. No momento em que a pergunta me foi posta, porém, eu desconhecia a autoria da frase, portanto minha reflexão foi menos preconceituosa, limitando-se à sentença em si. 

Pensando em minha própria experiência, concordei em parte. Porque acredito sim que o verdadeiro amigo seja solidário na desgraça, embora a solidariedade não signifique necessariamente que ele tenha que resolver a desgraça e assumir o problema como se fosse dele. Mas a segunda parte é bem verdade: não é qualquer "amigo" que consegue suportar o sucesso de quem já foi destinatário de sua esmola um dia.

Eu já passei por isso. Em momentos de dificuldades - financeira, familiar, afetiva, profissional -, quando tive que arcar com responsabilidades para as quais não acreditava estar preparada (mas é claro que eu estava), sempre tive alguns amigos por perto. Dispostos a me emprestar ou até doar dinheiro, oferecer-me um teto, um auxílio, uma solução. 

Isso tudo foi muito importante e naturalmente guardo um sentimento de gratidão por ter podido contar com esse socorro. Em contrapartida, ao me enxergarem como uma vítima, como uma pessoa incapaz de resolver seus próprios problemas, esses "amigos" não me olhavam de igual para igual. Havia sempre um tom de piedade, de lástima, de comiseração. E, com isso, os meus "protetores" sempre acreditavam que sabiam o que era melhor para mim, muito mais que eu mesma, já que eu era uma pobre desgraçada sem condições de fazer qualquer coisa por mim, inclusive decidir o meu destino.

Assim, o auxílio vinha sempre acompanhado de uma dose de humilhação. O que talvez se explique pela própria definição da palavra auxílio, de acordo com o dicionário Priberam da língua portuguesa:

auxílio (ss)
(latim auxilium, -ii)

s. m.
1. Ajuda que se presta àquele cujo esforço é insuficiente.
2. Esmola; socorro.

Tenho certeza de que tenho minha carga de culpa por não ter sabido antes sair da posição de vítima e assumir o papel de agente. E foi justamente no momento em que encontrei forças para isso, quando tive coragem de dizer "não, isso não é o melhor para mim", que essas pessoas me viraram as costas. Decidi conquistar meu espaço e percebi que eu não queria esmola nenhuma, que eu não precisava viver humilhada às custas da caridade alheia somente para aplacar alguma consciência, para fazer alguém dormir mais feliz porque estava ajudando uma pessoa necessitada, podendo contar para todo mundo sobre a nobreza de seu gesto altruísta.

O início da jornada de reassumir o controle da minha vida não foi fácil. Mas jamais duvidei de minha capacidade de superar os obstáculos que surgiram, mantive acesa a convicção de que passar por aquelas dificuldades por conta própria era muito melhor do que continuar sendo o objeto da caridade de alguém, quando existe no mundo tanta gente precisando muito mais de auxílio do que eu. Pessoas cujo esforço pessoal é de fato insuficiente para vencer, ao menos no momento, as agruras impostas pela vida.

É evidente que eu não venci sozinha. Continuei contando com amigos, percebendo então a diferença entre viver sob o jugo de quem duvidava da minha capacidade e contar com o apoio de quem acredita em meu potencial de alcançar o êxito por conta própria.

É claro que tenho muito ainda por conquistar. Não deixo de sonhar, de acreditar que as coisas podem ser melhores. Mas não perco o contato com a realidade nem o apreço por ela. Gosto de valorizar todos os dias  o que já consegui. 

E os amigos auxiliadores, para onde foram? Alguns ainda aparecem de vez em quando, dizem-se felizes com o meu sucesso. Nada que se compare à presença constante de seus olhares piedosos e à enorme disposição que tinham para orientar a minha vida quando eu estava mal. Outros simplesmente sumiram. Talvez em busca de novos projetos de caridade. Melhor assim.

Um comentário:

  1. É isto mesmo grande guerreira! A vida só ensina aquele que realmente quer aprender, ontem ainda comentavámos, tem pessoas que vão passar uma vida inteira e não terão aprendido nem 10% destes preciosos ensinamentos. Mas o bom mesmo é seguir adiante com a certeza de ser uma pessoa cada vez melhor, mais consciente, e consequentemente mais feliz!
    Bjo

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